Diálogos Ciencialist

 

Agosto de 2004

Brincando com as simetrias quânticasframes
Mensagem Única

 


Na mensagem 39647 da Ciencialist Esteban escreveu o seguinte:
Emmy Noether [...] foi uma das poucas a questionar a validade matemática da equação de Schrödinger, o que aliás ninguém soube defender, conforme explica o próprio Schrödinger em sua biografia. O único argumento que lhe coube é: mas minha equação funciona...
O comentário que eu fiz na mensagem 39661 foi o seguinte (ligeiramente modificado):
msg 39661
From: Alberto Mesquita Filho
Subject: Mecânica analítica.
Date: Sex, 6 de Ago de 2004 6:46 pm

De fato, é bem possível que isso tenha acontecido. Mas é bom que se diga também que Schrödinger nunca foi um fanático por suas equações. Schrödinger, Einstein, De Broglie e, muito especialmente, Planck, foram físicos com os pés no chão e jamais pretenderam construir um capítulo de ficção na física, por mais que suas idéias fossem disparatadas. Com respeito a sua famosa equação Schrödinger chegou a escrever:
Esperamos que a vacilação de conceitos e opiniões signifique apenas um intenso processo de transformação, que conduzirá finalmente a algo melhor do que as confusas séries de fórmulas que cercam o nosso tema.
Einstein, por seu turno, acreditava também nesse intenso processo de transformação, algo que acabou sendo bloqueado pelos dogmáticos defensores da física de Copenhague. No livro que escreveu com Infeld lê-se:
Será o desenvolvimento futuro ao longo da linha escolhida na Física Quântica, ou será mais provável que sejam introduzidas novas idéias revolucionárias na Física?
Ao lado desses descontentamentos, nota-se a esperança triunfal de Heisenberg:
Parece-me fascinante pensar que hoje, nos mais diversos países do mundo e com os meios mais poderosos de que dispõe a moderna tecnologia, se desenvolve uma luta para resolver em conjunto problemas colocados há dois milênios e meio pelos filósofos gregos e cuja resposta talvez venhamos a conhecer dentro de poucos anos ou, quando muito, em uma década ou duas.
O interessante é que já passou mais de meio século, desde que se firmou essa expectativa, e muitos continuam acreditando nesta profecia de um dos maiores gurus da seita quântica de Copenhague (Heisenberg não era de Copenhague mas fez parte da escola de pensamento que chegou a se consagrar com esse nome). Na verdade, o que sabemos hoje sobre as partículas elementares foi descrito há mais de meio século, por Schrödinger, com as seguintes palavras:
Se me perguntarem: o que são de fato essas partículas, esses átomos e moléculas? Devo admitir que conheço tão pouco a seu respeito como a origem do segundo jumento de Sancho Pança.
Como não admirar a sobriedade de Schrödinger?!!! James Trefil, mais recentemente (década de 80), chegou a dizer algo semelhante:
O que estamos realmente dizendo é que é muito difícil visualizar o que seja um elétron, porque não há nada em nossa experiência que nos sirva de guia. Portanto, o que a mecânica quântica nos diz é mais ou menos tão profundo quanto isto: um elétron não é como um carro.

Se o gif animado abaixo estiver
atrapalhando a leitura, tecle ESC

Vou aproveitar essa idéia do Trefil para associá-la ao tema simetria e mostrar que pode ser exatamente aí que os quânticos tenham se enganado. Sob certos aspectos o elétron é muito semelhante a um carro.

elétron e carro 

Com frequência se diz que o que distingue ou identifica dois férmions, por exemplo, aqueles da dupla elétron/pósitron, seria a quiralidade (quiralidade deriva da palavra grega que significa mão). Um dos membros do par seria dextrógiro e o outro levógiro, e isso com relação ao spin, pensado como se fosse um giro clássico. Para que se entenda melhor, diria que, aplicando-se a regra da mão direita, o polegar daria o sentido do movimento de translação e os demais dedos encurvam-se no sentido do "spin", para a partícula dextrógira. No outro caso, seria aplicável a regra da mão esquerda (partícula levógira). A figura abaixo ilustra o que estou dizendo. Isso funciona em quântica, mas não deixa de ser uma imagem clássica. Uma partícula dextrógira, colocada frente a um espelho, dará como imagem uma partícula levógira.

simetria quiral

Deixemos a quântica de lado e vamos raciocinar em termos 100% clássicos. Como esse elétron, dotado de um "spin clássico" (uma partícula dotada de um giro efetivo), iria se comportar quando colocado em um campo elétrico? Eu digo em minha teoria que o elétron irá orientar seu giro no sentido das linhas de campo. Ora, o que é uma corrente elétrica se não um conjunto de elétrons saltitando de um átomo para outro do condutor e originando um efeito resultante como se estivessem viajando da maneira mostrada na figura abaixo.

correntes

Pois bem. Vamos imaginar agora dois observadores estudando uma mesma corrente elétrica assim simplificada (efeito resultante). Um dos observadores está em repouso em relação ao laboratório e o outro em movimento na mesma direção e sentido dos elétrons, porém com velocidade V maior do que a velocidade v dos elétrons. Vamos admitir a possibilidade de ambos enxergarem o tipo de movimento de "giro clássico" dos elétrons. Digamos que o observador em repouso diga que os elétrons são dextrógiros. Que dirá o observador em movimento? A figura abaixo poderá ajudar na obtenção da resposta.

figura ele_car2

Provavelmente o segundo observador dirá que em virtude de seu movimento a "simetria se quebra", ou seja, as partículas dextrógiras se transformam em levógiras. Isto porque o giro não se modifica com a translação do seu referencial, mas o movimento translacional dos elétrons em relação a ele (observador) se inverte. Se para o primeiro observador os elétrons estiverem viajando da esquerda para a direita, para o segundo observador eles estarão viajando da direita para a esquerda. Será que em virtude deste relativismo "fajuta", um elétron transforma-se num pósitron?!!!!

Há muito tempo li, no Scientific American (creio que na década de 80), um artigo do Haim Harari onde ele afirmava o seguinte:
Ninguém ainda obteve êxito ao tentar construir um modelo composto por quarks e léptons nos quais a simetria quiral permaneça sem romper.
Do ponto de vista clássico é fácil explicar este insucesso: é suficiente mostrar o absurdo desta relatividade. Porém, do ponto de vista da física moderna já não está mais aqui quem falou, mesmo porque o "spin quântico" não é nada daquilo que um clássico imagina.

De uma coisa podemos estar certos: um elétron jamais se transformará num pósitron com a mudança de referencial. Mas além deste dado absoluto e relacionado à quiralidade, existe um outro que se relaciona aos elétrons numa corrente elétrica. Nenhum observador, não importa em que velocidade se encontre, enxergará um elétron caminhando de um potencial positivo para um negativo. Logo, no que diz respeito aos fenômenos eletromagnéticos, e esta quiralidade é uma propriedade eletromagnética, não faz sentido colocar um referencial não fixo à fonte de diferença de potencial ou, melhor dizendo, ao fio condutor. Um absurdo semelhante ao apresentado seria dizermos que "o automóvel que acabamos de ultrapassar está andando de marcha a ré." Deu para perceber a "mancada quântica"?

Sob este aspecto não faz sentido pensarmos em "quebra da simetria" com respeito ao movimento de translação. A quiralidade deve ser aqui pensada tão somente em relação ao que poderíamos chamar de "frente" do elétron. Sob o ponto de vista clássico, ainda que raciocinando com conceitos obtidos no século XX ¾em particular a existência do spin, constatada na terceira década do século XX, por volta de 1925-6,¾ eu diria que a "frente" do elétron é uma entidade "relativamente" absoluta, logo não se modifica em virtude da movimentação do observador.

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Alberto
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